Aposentadoria especial
Decreto esclarece o conceito de “atividade permanente”
por Sidnei Machado (*)
O Decreto nº 4.882, publicado no Diário Oficial da União do dia 19 de novembro, introduz conceito abrangente do que se deve entender por “atividade permanente”, um dos requisitos necessários para enquadramento da aposentadoria especial para os trabalhadores que prestam serviços em local de risco. Trata-se de uma das mais importantes medidas para solucionar o impasse causado na concessão das aposentadorias especiais nos últimos anos.
A noção técnica e jurídica do que se deve entender por atividade permanente vinha sendo o centro de enorme polêmica. Com o objetivo de restringir o acesso à aposentadoria especial, o artigo 65 do Decreto n. 3.048/99 exigia que o trabalhador comprasse, além do trabalho exposto a agentes nocivos, a exposição “durante toda a jornada”, para somente assim caracterizar a permanência. Ainda que se sujeitasse a trabalho nocivo, obviamente muitos trabalhadores não tinham condições de comprovar o trabalho com exposição integral durante jornada.
Esse conceito restritivo de atividade permanente propiciou a muitas empresas a não fornecerem aos trabalhadores o laudo técnico e o formulário para requer a aposentadoria (SB-40, DIRBEM 8030 ou DSS 8030). Para a maioria daqueles que obtiveram os documentos, o INSS indeferiu a contagem do tempo especial, justamente com o fundamento de que não estava comprovada a permanência, ante a ausência exposição durante toda a jornada. A única solução vinha sendo por meio da ação judicial, ingressada na Justiça Federal contra o INSS.
O Decreto n. 4.882 põem fim a esse entendimento restritivo e equivocado do INSS, ao conceituar a permanência (dando agora nova redação do art. 65 do Decreto n. 3.048/99), como o trabalho “no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação de serviço”(grifo nosso).
Desapareceu a menção da exigência de exposição durante toda jornada, sendo substituída pela referência a exposição “indissociável”. Isso significa que havendo agente nocivo ao qual o trabalhador esteja exposto, como dever inerente a sua função, em que há obrigação de trabalhar em local sujeito a risco a sua saúde ou integridade física de tal forma que faça parte de sua rotina, é o suficiente para caracterizar atividade com risco permanente. Dessa forma, a exposição a 1 ou 8 horas diárias aos agentes nocivos pode tornar-se irrelevante quando pela natureza do risco e da atividade tem o trabalhador que suportar a nocividade indissociável no ambiente de trabalho.
Não se trata de uma mudança no critério de enquadramento da aposentadoria especial. Na verdade, a antiga redação do art. 65 do Decreto continha uma falha na interpretação da Lei n. 8.213/91. A lei simplesmente assegurava aos trabalhadores o direito à aposentadoria especial para trabalhos em exposição à risco de sua saúde ou integridade física, comprovados por laudo técnico. Assim, a lei não faz qualquer exigência de duração da exposição. No entanto, o Decreto que tem a mera função de regulamentar a lei, viabilizando a sua aplicação, dava interpretação restritiva da lei, o que levou o judiciário a declarar em muitas decisões a sua ilegalidade. A nova redação do art. 65 do Decreto n. 3.048/99, sem introduzir restrições ao direito, melhor interpreta a lei, pois, em conformidade com a natureza dos riscos no ambiente de trabalho, onde o fator tempo não é requisito necessariamente determinante para a configuração da nocividade do ambiente. O número de horas em sujeição a condições nocivas será importante apenas para a verificação do nível de nocividade a que o trabalhador ficou sujeito.
A partir da vigência do novo Decreto, a análise dos pedidos de aposentadorias especiais pelo INSS deverá observar o requisito do risco indissociável, devendo os laudos técnicos doravante emitidos pelas empresas indicarem – além da função do empregado, o local de trabalho e os riscos no ambiente, indicar na conclusão sobre a exposição habitual e permanente – se a exposição faz parte da rotina do cargo ou função desempenhada pelo trabalhador, deixando de considerar para essa conclusão exclusivamente o fator tempo de exposição.
A outra alteração importante introduzida pelo Decreto n. 4.882 foi a unificação da classificação dos agentes nocivos previstos na legislação trabalhista e previdenciária. Assim, o enquadramento na aposentadoria especial por exposição à ruído, por exemplo, foi reduzida de 90 para 85 decibéis, para se adaptar ao previsto no anexo da NR 15. É entendimento judicial consolidado também que o simples uso de protetor auricular pelo trabalhador (EPI) não afasta o direito ao enquadramento na aposentadoria quando não comprovada a sua eficácia.
Os segurados da Previdência Social que pelo novo conceito de permanente podem ser enquadrados, devem requer a emissão de laudos técnicos e DIRBEM 8030 juntos aos respectivos empregadores e protocolar pedido de aposentadoria. Aqueles que tiveram benefícios indeferidos por motivo de não comprovação da permanência têm três alternativas: ingressar com novo processo; pedir revisão no processo antigo; ou postular diretamente na Justiça o direito à aposentadoria. Para receber os valores da aposentadoria desde o requerimento inicial, com correção monetária e juros, a melhor alternativa é a via judicial.
(*) advogado especialista em direito previdenciário, mestre e doutor em direito pela UFPR, professor de direito previdenciário.