GENEBRA (Notícias da OIT) – Um novo livro da Organização Internacional do Trabalho (OIT) diz que o trabalho à distância – produto do deslocamento e da subcontratação das empresas de países desenvolvidos nos países em desenvolvimento – está criando empregos que são de “qualidade razoável segundo os critérios locais”, mas que a indústria ainda tem um caminho a percorrer antes de alcançar o trabalho decente em sua totalidade.
“Offshoring and Working Conditions in Remote Work” (O deslocamento e as condições laborais no trabalho à distância) apresenta o primeiro estudo aprofundado da indústria de subcontratação de processos de negócios (BPO por sua sigla em inglês). Esta indústria pode ser dividida em “serviços de voz”, como callcenters, e “serviços de gestão”, que podem incluir tanto serviços financeiros, de contabilidade, processamento de dados e administração, e desenvolvimento de recursos humanos.
“Esta é uma indústria em rápido crescimento com um valor de cerca de 90 bilhões de dólares”, disse Jon Messenger, pesquisador principal do programa sobre as condições de trabalho e emprego da OIT e coeditor do estudo juntamente com Naj Ghosheh. “Escreveu-se muito sobre este fenômeno e suas repercussões no crescimento econômico e do emprego. No entanto, sabe-se muito pouco sobre as condições de trabalho na indústria BPO”.
O livro, que inclui estudos de casos em quatro importantes países de “destino” – Argentina, Brasil, Índia e Filipinas – analisa o trabalho à distância, seu impacto nos mercados laborais em geral e a força de trabalho em particular e as possíveis implicações sobre as condições de trabalho e emprego nos países onde a indústria BPO está em crescimento.
O panorama que emerge da análise das condições de trabalho nestes países é misto. “Por um lado, e ao contrário do que se supunha anteriormente, o trabalho à distância é de muito boa qualidade, segundo os critérios locais. Por exemplo, os salários dos trabalhadores BPO na Índia são cerca do dobro da média dos salários de outros setores da economia indiana. Nas Filipinas, os empregados BPO ganham 53 por cento a mais do que os trabalhadores da mesma idade em outras indústrias”, disse Messenger.
Por outro lado, é comum o trabalho noturno para oferecer serviços em tempo reaal a zonas horárias distantes e, geralmente, o trabalho é exercido sob pressão. “Os trabalhadores BPO enfrentam fortes cargas de trabalho e devem cumprir objetivos em matéria de desempenho. Além disso, estão sujeitos a normas estritas e procedimentos aplicados através de supervisão eletrônica. Se sabe que este tipo de organização do trabalho sob pressão produz altos níveis de estresse”, acrescentou Jon Messenger.
Outro aspecto negativo da indústria BPO é a alta taxa de rotatividade do pessoal, que em algumas empresas pode chegar a até 100 por cento ou mais anualmente.
O livro de Messenger e Ghosheh assinala que os trabalhos desempenhados por “serviços de gestão” costumam ser de maior qualidade que os trabalhos em callcenters, tanto em termos de salários como de outras condições de trabalho. Além disso, os trabalhadores que atendem a mercados no exterior parecem ter trabalhos de melhor qualidade do que aqueles que se concentram nos mercados nacionais, sobretudo como resultado de que para os empregos internacionais é exigida maior qualificação.
Ao analisar o impacto da crise econômica mundial sobre a indústria BPO o livro diz que algumas empresas – especialmente no setor bancário e de seguros – sofreram um impacto considerável que poderia afetar o resto da indústria, mas somente em curto prazo.
O estudo explica que é pouco provável que os fatores que impulsionaram a expansão da indústria – como por exemplo a busca constante pela redução de custos e conseguir tecnologias cada vez mais sofisticadas e de menor custo – diminuam. Pelo contrário, os mesmos poderiam ser incrementados em médio e longo prazos.
O livro assinala que a força de trabalho na indústria BPO é jovem, geralmente com bom nível cultural e predominantemente feminina. As mulheres – salvo exceções, a mais destacada delas a Índia – constituem a vasta maioria (60 por cento ou mais) dos empregados desta indústria em quase todos os países onde a mesma tem uma presença importante.
O livro conclui com algumas sugestões para políticas de governo e práticas empresariais que poderiam melhorar ainda mais a qualidade na indústria e aumentar sua produtividade.
Estas mudanças incluem medidas mais enérgicas para proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores noturnos, tal como expressa a Convenção sobre trabalho noturno da OIT; um novo planejamento dos processos de trabalho, em particular nos callcenters, de maneira que os empregados tenham maior flexibilidade para descansar ou ir ao banheiro; e políticas e práticas destinadas a melhorar o diálogo social na indústria o que beneficiaria tanto trabalhadores quanto empregadores.
“A indústria BPO foi apontada como o futuro do trabalho em uma economia de serviços e informação baseada no conhecimento. Outra vezes foi vitimizada como ‘um mundo feliz’ de empresas de informática onde os trabalhadores são explorados. A realidade, como podemos imaginar, é muito mais complexa. No fundo, se trata de uma indústria com o potencial de oferecer um modelo para o futuro de empregos de boa qualidade no setor de serviços e de empresas de alto rendimento na economia mundial”, concluiu Jon Messenger.