A CLT garante a jornada de cinco horas para os jornalistas profissionais. Uma antiga polêmica na interpretação nos tribunais do trabalho desse direito é se ele também é extensivo aos profissionais de empresas não jornalísticas que são contratados para funções típicas de jornalista. A maioria das empresa tem a prática de contratar os profissionais para jornada de oito horas e não remunera as horas extras. Essa discussão jurídica foi travada em processo trabalhista entre um jornalista e a empresa Renault, em São José do Pinhais, no Paraná.
O profissional trabalhou na Renault por onze anos, entre 2004 e 2015, em jornada de oito horas diárias, registrado como assessor de comunicação, uma tentativa de ocultar a atividade de jornalista. Na sentença proferida pela 1ª Vara do Trabalho de São José do Pinhais, no último dia 19 de setembro, o jornalista teve reconhecido o seu enquadramento como atividade típica de jornalista, com o consequente direito à jornada de cinco horas diárias. Com essa decisão, a Renault foi condenada a pagar três horas diárias como extras ao profissional, com adicional de 100%, prevista na convenção coletiva de trabalho da categoria no Estado.
As atividades e jornada de trabalho dos jornalistas estão previstas na seção XI da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), arts. 302 e 303, além dos artigos 2.º, 6º e 9.º do Decreto-Lei 972/69, que apresenta um extenso descritivo da função dos jornalistas profissionais. Confira a previsão na CLT: “Entende-se como jornalista o trabalhador intelectual cuja função se estende desde a busca de informações até a redação de notícias e artigos e a organização, orientação e direção desse trabalho” (art. 302) e, quanto à jornada “A duração normal do trabalho dos empregados compreendidos nesta Seção não deverá exceder de 5 (cinco) horas, tanto de dia como à noite” (art. 303).
Contudo, por uma interpretação equivocada da lei, muitas empresas acabam elevando a jornada de trabalho dos assessores de imprensa de cinco para oito horas. Seja em empresas privadas cuja atividade-fim não seja o jornalismo, seja em assessorias de imprensa, cuja finalidade é promover e dar visibilidade de seus clientes, os assessores de imprensa têm o mesmo direito de seus colegas de redação.
Aliás, este é o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, que editou a Orientação Jurisprudencial n. 407: “O jornalista que exerce funções típicas de sua profissão, independentemente do ramo de atividade do empregador, tem direito à jornada reduzida prevista no artigo 303 da CLT”
Além disso, a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), do Ministério do Trabalho, descreve os assessores de imprensa (código 2611-10) como profissionais do jornalismo (código 2611) pois estes “recolhem, redigem, registram através de imagens e de sons, interpretam e organizam informações e notícias a serem difundidas, expondo, analisando e comentando os acontecimentos. Fazem seleção, revisão e preparo definitivo das matérias jornalísticas a serem divulgadas em jornais, revistas, televisão, rádio, internet, assessorias de imprensa e quaisquer outros meios de comunicação com o público”.
Jornada de cinco horas para assessores
Essa é uma das definições que reforçam que assessores de imprensa têm direito a jornada de cinco horas. Essa argumentação foi utilizada na ação trabalhista pelo advogado Christian Marcello Mañas, sócio do escritório Sidnei Machado Advogados Associados. De acordo com o advogado, “a decisão da Vara do Trabalho de São José dos Pinhais está atenta ao entendimento atual sobre o reconhecimento da função do assessor de imprensa como jornalista, conforme comprovado nos autos mediante prova documental e testemunhal, independentemente do nome do cargo”.
No caso, a Renault entendia que a função desempenhada não era de jornalista, embora o trabalhador exercesse a função de “jornalista responsável” em diversos materiais jornalísticos, “além de realizar “redação”, “edição” e “textos” dos veículos de comunicação da empresa. Além disso, escrevia discursos para o Presidente, acompanhava eventos e lançamentos de produtos”, como exposto na ação.
Outra característica do profissional, mesmo como assessor de imprensa, era “atender as demandas da imprensa, escrever textos jornalísticos (releases) sobre as ações da Renault, tais como investimentos, meio ambiente e área social, além de fazer a cobertura de eventos”. Para o defensor, as atividades realizadas pelo autor eram inerentes à função privativa de jornalista profissional, tal como previsto no Decreto-Lei 972/69 e Decreto 83824/79, o que lhe dá direito a jornada de cinco horas, conforme entendimento consolidado pelo TST, independentemente de ser uma empresa de ramo diversos do jornalismo.
A argumentação foi acolhida pela juíza Edilaine Stinglin Caetano. Para a magistrada, que aplicou o art. 2º, do Decreto 83.824/1979 e o art. 302, §1º, da CLT, não há dúvida quanto ao fato de que o trabalhador laborou como jornalista. Ao decidir, a juíza Edilaine Stinglin levou em consideração provas testemunhais e documentais que comprovam o desempenho das atividades jornalísticas, mesmo que contratado como “analista de comunicação” ou “assessor de imprensa”.
“Com efeito, tendo em vista o enquadramento do reclamante na função de jornalista, inegável que ele faz jus à jornada de cinco horas diárias bem como à adoção do divisor 150 (cento e cinquenta), nos termos dos referidos dispositivos consolidados”, concluiu a juíza.