Contratar empregados como pessoas jurídicas, com objetivo de fraude, é prática ainda frequente nas relações de trabalho no Brasil. A tentativa de fuga da CLT pela “pejotização” significa formalizar contrato de prestação de serviços, com máscara formal de contrato entre pessoas jurídicas, para regular de fato a relação de trabalho subordinado entre empregado e empregador.
Porém, como o enquadramento na relação trabalhista se dá por uma a relação de fato, e não pela vontade dos contratantes, o contrato pode ser anulado por decisão da Justiça do Trabalho.
Esse é o caso de um torneiro mecânico, que trabalhava em Pinhais, na região de Curitiba, que obteve na Justiça do Trabalho decisão favorável à conversão do contrato de PJ em contrato de trabalho, com a condenação da empresa no pagamento de todos os créditos de férias, 13º salário, FGTS, entre outros direitos de natureza trabalhista.
Na reclamatória trabalhista promovida pelo advogado Christian Marcello Mañas, integrante do escritório Sidnei Machado Advogados, foi informado que mecânico foi contratado por uma empresa do município em 14 de fevereiro de 2005, permanecendo no emprego até 30 de setembro de 2013. No entanto, a partir de 5 de novembro de 2007, o trabalhador foi obrigado a constituir empresa própria (Pessoa Jurídica) para continuar trabalhando no local e na mesma função para a qual havia sido contratado anteriormente.
Subordinação
“Durante o período posterior à anotação em carteira de trabalho (2007 a 2013), foram mantidos todos os elementos caracterizadores da relação de emprego (CLT artigo 3º). O trabalho era pessoal, habitual, remunerado mensalmente e havia subordinação, a exemplo do cumprimento de diretrizes, metas e objetivos fixados pela ré”, ressalta Christian Marcello Mañas.
Fraude
Para o advogado “a alteração do contrato de trabalho do autor para a forma de prestação de serviços, conhecida prática de fraude da relação de emprego, visou apenas ocultar e impedir a manutenção do contrato de trabalho subordinado iniciado em 2007. Mesmo assim, observa-se que do próprio contrato de prestação de serviços há elementos de caracterização do vínculo (exemplo: trabalho na sede da ré; pagamento de “remuneração mensal”; reajustamento salarial anual pela CCT do sindicato dos metalúrgicos: fornecimento de alimentação a transporte).”
As provas documentais e testemunhas ouvidas foram suficiente para que a decisão que acabou por reconhecer a nulidade da prestação de serviços por meio de pessoa jurídica posterior a novembro de 2007, com a admissão do vínculo de emprego único em todo o período (14.02.2005 a 30.09.2013), determinando-se a retificação da anotação da CTPS do trabalhador e o pagamento dos créditos decorrentes do vínculo posterior.
Sentença
A ação foi ajuizada na Vara do Trabalho de Pinhais (primeira instância) em 21 de março de 2014. Na decisão, a juíza do trabalho Karla Grace Mesquita Izídio reconheceu o vínculo de trabalho empregatício e condenou a empresa a retificar o registro na CTPS e pagar direitos trabalhistas (férias, 13º. Salário, FGTS, aviso prévio, entre outros).
“Reputa-se que o reclamante manteve vínculo empregatício com a reclamada, no período compreendido entre 14/02/2005 e 30/09/2013, exercendo ele a função de torneiro mecânico, com salários registrados em CTPS e, nos períodos sem registro, com salário equivalente às notas fiscais emitidas por sua empresa”, destacou a juíza na sentença.
A empresa recorreu ao TRT, em Curitiba (Tribunal Regional do Trabalho).
Acórdão
O acórdão do TRT manteve a sentença que reconheceu a nulidade da contratação via pessoa jurídica.
Conforme bem destacou a Desembargadora Relatora do processo, Marlene Suguimatsu, “algumas empresas, com vistas à obtenção de maior lucratividade e redução de custos, têm se valido de prática bastante conhecida pela Justiça do Trabalho, denominada na linguagem comum de “pejotização”. Por esse expediente o trabalhador é obrigado a constituir uma pessoa jurídica e, a partir da assinatura de um contrato de prestação de serviços passa a prestar serviços para a empresa contratante formalmente como autônomo ou prestador de serviços, embora na realidade seja empregado. Por esse expediente a contratante se beneficia da mão-de-obra contratada, sem os encargos trabalhistas e previdenciários decorrentes.”
No acórdão foi destacado também que a empresa do autor foi constituída à época da “rescisão” do contrato de trabalho com a finalidade de prestar serviços para a ré, com habitualidade, onerosidade e pessoalidade, sendo o trabalhador (autor da ação) incapaz de realizar, de forma autônoma, os “serviços” contratados, pois realizado no estabelecimento da empresa ré, com seus equipamentos e de acordo com suas “solicitações”, o que comprovou a subordinação na prestação de serviços.
Todas as circunstâncias do caso concreto demonstraram que a constituição de pessoa jurídica pelo trabalhador ocorreu em fraude a direitos trabalhistas e com a finalidade de descaracterizar a relação de emprego existente entre as partes, a teor dos arts. 2º e 3º da CLT, que todavia, se fizeram presentes durante os oito anos de serviços prestados de forma ininterrupta em benefício exclusivo da empresa contratante.
Sidnei Machado Advogados. Curitiba, 24 de março de 2016.