TST nega validade a cláusula que restringe acesso ao Judiciário
A liberdade entre as partes para estabelecer acordos coletivos é limitada pelos direitos garantidos na Constituição, sobretudo aqueles considerados como fundamentais. Com essa tese, manifestada pelo Ministro Renato de Lacerda Paiva (relator), a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou inconstitucional cláusula de convenção coletiva que condicionava o acesso do trabalhador à Justiça a uma tentativa de negociação prévia e direta com a empresa. O órgão do TST acolheu recurso de um ex-empregado da Pirelli Pneus S/A .
“O objetivo das normas coletivas é o de disciplinar condições de trabalho; não podem criar obstáculos ao acesso ao Judiciário e restringir os direitos, muito menos quando se trata de um direito fundamental, como a garantia de acesso ao Judiciário”, considerou Renato Paiva ao negar a vigência da cláusula.
O tema constou de acordo coletivo firmado entre a Pirelli Pneus S/A e Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Artefatos de Borracha de Campinas e Região. Segundo a cláusula 5ª do acordo, “o ex-empregado e/ou o sindicato obriga-se a não propor ação judicial sem antes submeter a divergência à tentativa de solução pacífica e direta com a empresa”.
A previsão da norma coletiva foi considerada válida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP), e esse posicionamento levou à extinção de processo submetido pelo ex-empregado em busca do pagamento de parcelas salariais. Como o trabalhador não tentou resolver o conflito no âmbito da empresa, teve sua iniciativa judicial frustrada pelo TRT. “Da análise da referida cláusula, chega-se à conclusão de que ela não impede o acesso do trabalhador ao Judiciário, mas apenas o condiciona ao cumprimento de determinado procedimento”, considerou o TRT.
A Segunda Turma do TST, contudo, entendeu a cláusula como inconstitucional por restringir o direito fundamental de acesso ao Judiciário e por não ser objetivo da negociação coletiva a restrição de direitos fundamentais, insuscetíveis de mudanças por determinação da própria Constituição. “Se o próprio legislador tem de observar limites se quiser restringir direitos fundamentais, mais ainda as partes envolvidas na negociação coletiva”, sustentou Renato Paiva.
O relator ainda desenvolveu um argumento de ordem prática sobre o tema, a partir da recusa do trabalhador em submeter sua reivindicação à negociação interna e optar pelo acesso direto ao Judiciário. Em tal situação, frisou Renato Paiva, a conciliação – objetivo buscado pela própria cláusula coletiva – poderia ser alcançada na primeira audiência judicial. Ocorre que a empresa recusou a conciliação em juízo.
“Tem-se o absurdo de trazer o processo até o TST e extingui-lo pelo descumprimento da condição da cláusula, mandando o trabalhador para a conciliação prévia quando a própria empresa já disse, no processo, que não quer conciliar”, concluiu o relator, ao determinar o retorno dos autos ao TRT para o exame dos pedidos do trabalhador. Durante o julgamento, foi esclarecido que a negociação coletiva envolvendo a Pirelli e o Sindicato profissional remonta ao ano de 1995, antes da entrada em vigor da Lei 9.958/2000, que instituiu as Comissões de Conciliação Prévia.