Lei passa a exigir prova de contribuição ao INSS para concessão de benefícios

Lei passa a exigir prova de contribuição ao INSS para concessão de benefícios

Por Sidnei Machado*

Provar tempo de serviço e contribuições na hora de requerer benefício no INSS sempre foi um dos maiores embaraços aos segurados. Para dar início a um pedido de aposentadoria, pensão ou auxílio, por exemplo, cabia exclusivamente ao segurado comprovar perante o INSS a condição de filiado, por meio de documentos originais, da época, sem qualquer rasura, de tal forma que não suscitasse qualquer dúvida. Qualquer lacuna nos documentos era o suficiente para se indeferir o benefício.

        Com a edição da Lei nº10.403/02 e o Decreto nº4.079/02, a documentação exigida ao segurado foi reduzida, ao ser transferido para INSS a obrigação de manter as informações necessárias para comprovação de tempo de serviço e das contribuições dos segurados. As informações passarão a ser obtidas pelo Cadastro de Informações Sociais (CNIS), mantido pela Previdência Social.

       Para pedir a aposentadoria, por exemplo, o segurado era obrigado a dirigir-se a uma agência da Previdência Social munido de Carteira de Trabalho, relação dos salários de contribuições (a partir de junho/94), além de comprovante de endereço e cópias de RG e CPF. Com a nova lei, o segurado não mais precisa apresentar a Carteira de Trabalho e a relação de salários.

        A sanção da lei pelo Presidente da República foi amplamente divulgada pela imprensa como um importante avanço. Porém, não há muito a festejar. A verdadeira motivação do governo, no entanto, não veio para atender exclusivamente os interesses dos segurados, mas de arrecadação da Previdência. Acreditamos que essa medida somente trará novas dificuldades para a concessão de benefícios.

        Pela nova sistemática, ao analisar um pedido de benefício, o INSS consultará primeiro os seus dados para verificar se houve recolhimento de contribuição pelo segurado e/ou pela empresa no período. Ou seja, antes o trabalhador comprovava pela Carteira apenas o tempo de trabalho. Com a nova lei, além da Carteira de Trabalho, a prova de “relação de emprego, tempo de serviço ou de contribuição e salário de contribuição” serão feitas pelo CNIS (art. 19 do Decreto nº4.079/02 – grifamos).

         Fica claro então que a nova lei, em verdade, ao contrário do que se alardeou, passa a condicionar a concessão de benefícios à efetiva comprovação de contribuição à Previdência Social. Essa intenção está explícita no art. 1º §2º do Decreto nº4.079, o qual esclarece que “Não constando do CNIS informações sobre contribuições ou remunerações, o vínculo não será considerado(…)”. Caso a empresa não tenha recolhido as contribuições à Previdência Social, certamente o CNIS acusará e, conseqüentemente, o INSS não reconhecerá o tempo de serviço e de contribuição. A solução dada pelo Decreto neste caso é comprovar o recolhimento das contribuições por outro meio ou, é claro, responder o segurado pessoalmente pelos valores. Com isso introduziu-se um requisito novo para concessão de benefício: prova de contribuição ao INSS.

          Não se defende que Previdência não deva adotar mecanismos eficazes para fiscalizar e cobrar as contribuições para o seu custeio. Contudo, a ausência de contribuição pela empresa não pode representar fato que impeça o pagamento do benefício ao segurado, o qual não pode ser responsabilizado pela inadimplência de terceiro, não podendo sofrer prejuízos. Para o não pagamento de benefícios, goza a Previdência Social de todo arcabouço legal da ação fiscal (administrativa) e executiva (esfera judicial). Esse é o devido processo legal para se exigir contribuições não recolhidas nas épocas oportunas.

          É fato que a lei beneficiará aquele trabalhador que extraviou a sua carteira de trabalho ou a empresa dificulta o fornecimento da relação de salários, embora tenham sido feitas corretamente as contribuições. Mas trocando em miúdos, o maior resultado prático da nova lei será o de transferir ao trabalhador o ônus de arcar com o prejuízo da ausência de recolhimento, pelo indeferimento de benefícios por falta de comprovação de contribuição. Sabendo que a inadimplência com a Previdência Social no Brasil é alarmante, a lei será lembrada como mais uma histórica contribuição deste governo para restringir o acesso do cidadão à Seguridade Social. Aos poucos o regime de proteção social se transforma em um regime meramente contributivo, de caráter eminentemente privado.

* Sidnei Machado é advogado, mestre, doutor em Direito e professor de Direito Previdenciário.