Sidnei Machado comenta em entrevista os impactos do novo Código de Processo Civil

Novo Código de Processo Civil entra em vigor com expectativa de modernizar o processo, “mas concretização de avanços dependerá da renovação da cultura jurídica”, avalia o advogado Sidnei Machado

Desde o dia 18 de março está em vigor o NCPC (Novo Código de Processo Civil). Após sete anos de discussões no Congresso, a nova lei foi aprovada com a promessa de melhorar nosso sistema judiciário. O advogado e professor universitário Sidnei Machado comenta os pontos negativos e positivos do NCPC nesta entrevista. Confira:

Pergunta: Quais são os grandes destaques do novo Código?

Sidnei Machado: O novo código nasce com o propósito de imprimir uma maior celeridade e efetividade na prestação dos serviços de Justiça no país. É uma promessa com um imenso desafio, a julgar pelo déficit que temos com um processo moroso, caro e, portanto, pouco eficiente. No entanto, apesar das inúmeras inovações, as mudanças não vão pôr fim a um processo excessivamente formalista e lento. Permanecem em vigor mecanismos burocráticos, com excesso de prazos e de recursos. Em suma, há avanços a comemorar, mas eles não devem promover um processo de rápida entrega da prestação jurisdicional.

Pergunta: Por quê?

Sidnei Machado: Atualmente os processos judiciais demandam anos para uma solução final, às vezes cinco ou até dez anos. Isso não é razoável. É intolerável numa sociedade como a nossa que exige soluções rápidas para os conflitos. Todos estão de acordo com isso, pois a demora excessiva não promove a plena e efetiva prestação da Justiça. Um processo rápido não pode superar a 6 meses de tramitação. O outro grande problema que subsiste é que o processo tem alto custo e isso limita o acesso à justiça. Somente as grandes empresas e de maior renda têm capacidade de pagar bons advogados e suportar as custas para uma defesa eficiente. Os serviços públicos de defensorias, que prestam serviços gratuitos, ainda estão em processo de estruturação e não têm defensores e recursos suficientes.

Pergunta: No entanto, há aspectos positivos. Quais seriam?

Sidnei Machado: De fato, alguns dispositivos do novo código podem ser interpretados como avanço em relação ao modelo anterior, do código que estava em vigor desde 1973. Para citar um exemplo, o novo código busca evitar que vários tribunais e juízes ignorem a jurisprudência predominante em determinado assunto. Para combater a “jurisprudência lotérica”, que permitia, por exemplo, que dois juízes decidissem situações idênticas de modos distintos, passa doravante a obrigar ao juiz o respeito aos precedentes das cortes superiores. Isso de fato tende a dar maior segurança jurídica, pois o cidadão que acompanha o entendimento dos tribunais pode a partir de agora guiar-se pela jurisprudência estabilizada.

Pergunta: Há outras inovações de impacto?

Sidnei Machado: Sim. Se destacarmos dentre os 1072 artigos que compõem o código, há dispositivos que melhoram a distribuição da obrigação de prova no processo. Há previsão de que o juiz deva fundamentar a sua decisão enfrentando todos os argumentos deduzidos pelas partes. Com isso promove-se um maior debate no processo, democratiza o processo e melhora a qualidade da prestação jurisdicional.

Pergunta: E nos processos trabalhistas, o que muda?

Sidnei Machado: Os processos trabalhistas, embora tenham um procedimento específico previsto na CLT que continua em vigor desde 1943, também serão impactados com a aplicação seletiva de alguns dispositivos do Código de Processo Civil. Há um acirrado debate entre especialistas do Direito do Trabalho trabalho sobre quais artigos serão aplicados. A tendência, acredito, é que a jurisprudência no âmbito da Justiça do Trabalho aplique restritivamente o novo Código. A disputa é muito mais sobre o critério para a escolha seletiva. O meu receio é que não haja um critério correto de valoração e que sejam importados para o processo do trabalho procedimentos incompatíveis. No processo do trabalho o mais importante é assegurar a efetiva aplicação das leis trabalhistas e o processo é um meio.

Pergunta: A atividade da advocacia sofrerá impacto também com o novo Código?

Sidnei Machado: A advocacia terá uma substantiva mudança de rotina da prestação de serviço. Porém, o mais relevante, acredito, sejam as potencialidades que se abrirão para novas ferramentas e estratégias nos processos. Isso exige um profissional mais preparado, com uma sólida cultura jurídica, pois o processo não se resume a mera técnica. Em síntese, a contribuição mais relevante, e que permitirá a concretização de melhoras no judiciário a partir do novo código, é uma cultura jurídica renovada.

Sidnei Machado Advogados. Curitiba, 25 de março de 2016.