Terceirização e isonomia salarial na Petrobrás

A Petrobrás, empresa pública, é conhecida como uma das empresas que mais faz uso intensivo de mão-de-obra terceirizada. Dados do balanço social da estatal de 2012 indicam possuir em seus quadros 360.372 trabalhadores terceirizados, ante cerca de 85.065 empregados próprios. A contratação do serviço nesse caso se dá sem o mecanismo do concurso público e tem como motivação principal o menor preço da mão-de-obra.

Isso resulta em grande diferenciação salarial e de condições de trabalho entre empregados próprios e terceirizados. Embora a Petrobrás, de acordo com o disposto art. 37, II, da Constituição Federal, seja obrigada a contratar empregados por concurso público, a configuração da terceirização não impede o reconhecimento de direitos inerentes à isonomia salarial entre empregados da tomadora na mesma função e os trabalhadores terceirizados, conforme atribuições definidas na tabela de cargos e salários.

Para o advogado Christian Marcello Mañas, do escritório Sidnei Machado Advogados Associados, não é preciso sequer avaliar se a terceirização é tida como ilícita ou não, porque o tratamento isonômico de trabalhador terceirizado com aqueles empregados diretamente admitidos pela empresa tomadora de serviços lhe é outorgado pelo chamado salário equitativo. “Observado o princípio das mesmas funções, a igualdade salarial visa, neste caso, evitar a ocorrência de tratamento discriminatório entre os empregados da empresa prestadora de serviços e os da tomadora”, explica Mañas, de acordo com a Constituição Federal, art. 7º, XXXII.

Conquanto a jurisprudência predominante não admita o reconhecimento de vínculo de emprego direto com a empresa estatal ante a ausência de concurso público, ainda que haja ou não fraude, trata-se da hipótese típica de assegurar igualdade de tratamento salarial, ou seja, os mesmos direitos de empregados em funções idênticas, na linha do atual entendimento do TST. De fato, no âmbito da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) se admite amplamente a isonomia em caso de terceirização quando demonstrada a igualdade de funções entre trabalhadores terceirizados e empregados diretos (Orientação Jurisprudencial 383).

O tratamento isonômico consolidado pela jurisprudência do TST visa afastar os efeitos perversos e discriminatórios da terceirização. Trata-se de mecanismo hábil a propiciar que o ilícito trabalhista não perpetre maiores benefícios a seu praticante, encontrando amparo nos artigos 5º, caput, e 7º, XXXII, da Constituição, que proíbe distinção entre trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos.

Mañas destaca que a igualdade de direitos, observado o exercício das mesmas funções, que permite reconhecer aos empregados terceirizados os mesmos direitos dos trabalhadores contratados pela tomadora dos serviços, tem também fundamento no art. 12 (alínea a, da Lei nº 6.019/74), que efetivamente assegura igualdade de salários e faz referência ao princípio da isonomia, visando evitar tratamento salarial diferenciado àqueles trabalhadores que exerçam trabalho igual para um mesmo empregador.

No caso da Petrobrás, em alguns setores é comum observar a flagrante violação do princípio da isonomia salarial entre os empregados próprios e de prestadoras de serviços, que realizam atividades idênticas, mas que recebem salários e benefícios inferiores, pois os empregados próprios (petroleiros) recebem, além de salário básico maior, férias com gratificação em dobro, adicional de periculosidade, adicional por tempo de serviço, participação nos lucros e resultados, além de diversos outros benefícios diretos e indiretos.

Em pesquisa realizada pelo DIEESE em parceria com a CUT, em 2011, observam-se números alarmantes a respeito da terceirização no país. A pesquisa identifica que a remuneração dos trabalhadores terceirizados é inferior, em 27,1%, à remuneração dos trabalhadores permanentes. Além disso, os dados indicam que a remuneração dos trabalhadores terceirizados se concentra nas faixas de 1 a 2 salários mínimos e de 3 a 4 salários mínimos, ao passo que os empregados diretos estão mais distribuídos entre as diversas faixas salariais. Quanto à jornada de trabalho contratada, a pesquisa constata que a jornada desse grupo de trabalhadores, semanalmente, é superior em 3 horas que a exercida pelos trabalhadores permanentes, sem considerar as horas extraordinárias e os bancos de horas realizados. O tempo de emprego demonstra uma diferença ainda maior entre trabalhadores diretos e terceiros: enquanto a permanência no trabalho é de 5,8 anos para os empregados diretos, em média, os terceiros permanecem por 2,6 anos.

Além disso, não bastasse o tratamento salarial diferenciado, a garantia de tratamento isonômico também se impõe ante a estrita subordinação jurídica havida na prestação do trabalho entre terceirizados e próprios do quadro da Petrobrás, que se submetem às rigorosas diretrizes, normas internas e ordens diretas da tomadora de serviço. Assim, quando a Petrobrás contrata, de forma terceirizada, trabalhadores cujas atribuições estão inseridas na sua tabela de cargos e salários e, portanto, são de necessidade permanente da empresa, tem-se que essa contratação terceirizada não se subsume a nenhuma das hipóteses excepcionais de tolerância à terceirização.

Para o advogado Mañas, observa-se que o poder judiciário em geral, pautado pelo entendimento atual do TST, vem sufragando a tese de serem extensivas ao trabalhador terceirizado as mesmas vantagens salariais reconhecidas aos empregados diretos de empresas, sobretudo as estatais, em razão de terceirização irregular.