Expurgo inflacionário. Diferenças do saldo da conta vinculada. Reflexos na multa rescisória.


EXPURGO INFLACIONÁRIO. DIFERENÇAS DO SALDO DA CONTA VINCULADA. REFLEXOS NA MULTA RESCISÓRIA.

1. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. ATRIBUIÇÃO À CEF. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO 297. RECONHECIMENTO DA LEGITIMIDADE EM FACE DA LEI PROCESSUAL E DO § 1º DO ART. 18 DA LEI 8.036/90.
2. PRESCRIÇÃO. CONTAGEM A PARTIR DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO QUE DETERMINOU A RETIFICAÇÃO DO SALDO DA CONTA VINCULADA. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 7º, XXIX, DA CF/88.
3. DIFERENÇA DA MULTA RESCISÓRIA PELA CORREÇÃO DO SALDO A POSTERIORI. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO 297 EM PARTE DA IMPUGNAÇÃO. TESE QUE NÃO CONTRARIA O ART. 5º, XXXVI, DA CONSTITUIÇÃO.

Recurso de revista não conhecido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº TST-RR-82997/2003-900-04-00.0, em que é Recorrente BANCO SANTANDER MERIDIONAL S.A. e é Recorrido FLÁVIO PEDRO BINZ.

Pelo v. acórdão certificado às fls. 91/92, o Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região deu provimento ao recurso ordinário do Reclamante para afastar a prescrição declarada em primeiro grau. Com fundamento no art. 515, par. 1º do CPC, julgou a questão de fundo, condenando o Reclamado ao pagamento de diferenças da multa de 40% do FGTS sobre diferenças de saldo da conta vinculada.

Dessa decisão recorre de revista o Reclamado, pelas razões de fls.95/100. Argúi preliminar de ilegitimidade passiva, renovando a invocação de prescrição, além de impugnar a questão de fundo.

Admitido às fls. 108/109, o recurso não foi impugnado por contra-razões.

Sem parecer do d. Ministério Público, na forma do art. 82 do RITST.

Processo submetido ao procedimento sumaríssimo, nos termos da Lei nº9.957/00.

É o relatório.

VOTO

1. CONHECIMENTO
Satisfeitos os pressupostos comuns de admissibilidade: custas recolhidas às fls. 106, depósito recursal à fl. 105 (total do valor da causa) e procuração à fl. 102. Recurso tempestivo (fls. 93 e 94 prorrogação do dies a quo). Passo a examinar os pressupostos específicos do recurso de revista.

Trata-se de processo submetido ao procedimento sumaríssimo, dado que a reclamatória foi proposta após a vigência das alterações instituídas pela Lei 9.957/00, reunindo-se seus requisitos. Diante disso, analisa-se a impugnação sob o prisma da possibilidade de violação direta de preceito da Constituição ou de contrariedade à súmula do Tribunal Superior do Trabalho (CLT, art. 896, par. 6º).

1.1. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA
Aduz o Reclamado que, cuidando o pedido de diferenças oriundas de irregularidades na atualização dos depósitos do FGTS, cabia à Caixa Econômica Federal a legitimidade passiva para responder à reclamatória.

Trata-se, contudo, de matéria não cogitada explicitamente no v. acórdão regional, que se limitou ao exame da prescrição e da matéria de fundo. O Eg. Regional fez menção acerca da legitimidade do Reclamado, ante os termos do o art. 18 da Lei 8.036/90, mas nada cogitou a respeito da CEF.

Sendo matéria preliminar de defesa, cabia ao Recorrente prequestioná-la, a teor do Enunciado 297, o que não ocorreu, sequer mediante a sua invocação nas contra-razões ao recurso ordinário.

Ainda que assim não fosse, a legitimidade passiva decorre da identidade entre a parte e aquela contra quem é pedida a tutela jurisdicional, o que se mostra evidente.

Ademais, a clara redação do par. 1º do art. 18, da Lei 8.036/90 não deixa dúvida quanto a caber ao empregador a obrigação do pagamento da multa fundiária, considerado o montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros (verbis).

De tudo resulta inviável reconhecer qualquer afronta de natureza constitucional.

NÃO CONHEÇO.

1.2. PRESCRIÇÃO
A reclamatória tem por objeto a condenação do Reclamado ao pagamento de diferenças da multa rescisória. Tais diferenças seriam devidas em face da retificação da atualização monetária do saldo da conta vinculada, determinada à CEF por decisão da Justiça Federal, posterior à rescisão.

O Eg. Regional emitiu tese no sentido de que o prazo prescricional começa a correr do trânsito em julgado da decisão da Justiça Federal, que determinara a correção do saldo da conta vinculada, não a partir do término do contrato de trabalho.

Alegando que a reclamatória está inteiramente prescrita, o Reclamado aponta violação do art. do art. 7º, XXIX, da Constituição e contrariedade ao Enunciado 362.

A decisão recorrida revela coerente raciocínio jurídico, tendo em vista o fato de que à época da rescisão ainda não havia saldo corrigido, que constitui a situação jurígena geradora da actio nata, e que só se consolidou com o trânsito em julgado da decisão judicial que determinou a retificação.

Diante disso, não vislumbro como extrair violação direta do preceito constitucional.

O Enunciado 362 não trata da hipótese em debate, que por sua vez não diz respeito a pedido de diferenças pelo não-recolhimento das contribuições fundiárias.

NÃO CONHEÇO.

1.3. DIFERENÇA DA MULTA DE 40% DO FGTS
O Eg. Regional entendeu devida a diferença da multa fundiária, em face de outras diferenças ( expurgo inflacionário), resultantes de atualização a menor do saldo da conta vinculada, à época da rescisão. Como fundamento invocou o art. 18 da Lei 8.036/90, que atribui ao empregador o pagamento da multa sobre o montante dos depósitos corrigidos, assim como a decisão judicial que determinou o retificação do saldo.

A maior parte da impugnação se dirige a afirmar tese contrária aos incisos II e XXXVI, do art. 5º, da Constituição a condenação do Reclamado ao pagamento das diferenças em questão, tendo em vista os termos da Lei Complementar 110/01. Dado que esse diploma não foi considerado na análise feita pela Corte de origem, resta não prequestionada a matéria, por conseguinte sem chance de acolhimento as alegações de violação legal invocadas com fundamento nisso.

Mesmo que se considere o simples fato do pagamento da multa rescisória como ato jurídico perfeito e acabado, ainda assim não se vislumbra possibilidade de ofensa ao art. 5º, XXXVI da Constituição.

Uma vez que o Excelso Supremo Tribunal Federal considerou as diferenças resultantes do expurgo direito adquirido dos empregados (RE 226.855, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 13/10/00), consectária é a atualização dos saldos pelo Gestor, assim como a complementação da indenização compensatória.

A má interpretação da lei de política econômica, a inabilidade do agente gestor, como quer que se atribua a causa das diferenças resultantes do expurgo – considerado direito adquirido pelo Excelso Supremo Tribunal – nada afetam o conteúdo da Lei 8.036/90, no tocante à distribuição de encargos e competências, em especial quanto à obrigação do pagamento da multa fundiária.

Há precedentes desta Corte neste mesmo sentido, dos quais pode-se destacar o seguinte:

DIFERENÇA DE MULTA DE 40% DO FGTS – EXPURGOS INFLACIONÁRIOS -RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO.

Pela análise das normas dos arts. 9º, § 1º, do Decreto nº 99684, estabelecido pelo Decreto nº 2430/97, e 18, § 1º, da Lei nº 8036/90, verifica-se que o único que deve responder pela multa fundiária é o empregador, e tendo caráter acessório as diferenças da aludida multa decorrentes dos expurgos inflacionários, deve esse recompor a totalidade dos depósitos, ainda que proveniente de desídia do órgão gestor da garantia. Ressalte-se que o fato de a diferença advir da aplicação dos expurgos inflacionários, reconhecidos pelo STF como direitos adquiridos dos trabalhadores, não afasta a responsabilidade do empregador, uma vez que a reparação pecuniária caberá àquele que tinha obrigação de satisfazer a multa fundiária à época da dispensa sem justa causa. Todavia, eventual direito de reembolso ao empregador quanto às diferenças dos 40% sobre o FGTS em decorrência dos expurgos inflacionários demanda ação de regresso pela via ordinária. ( RR 880-2001-009-03-00, Quarta Turma, DJ 7/3/03, Rel. Min. Antônio José de Barros Levenhagen)

NÃO CONHEÇO.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho, unanimemente, não conhecer do recurso de revista.

Brasília, 28 de maio de 2003.

SAMUEL CORRÊA LEITE
Juiz Convocado Relator